Artigo

O alerta de Bilac

Por Sergio Cruz Lima - [email protected]

Blumenau. Santa Catarina. 1905. Alwin Franz Schrader, prefeito local, ordena um levantamento do número de escolas particulares existentes no Município. Sua intenção é incorporá-las à Prefeitura. E constata uma dura realidade. Das 112 escolas existentes, 81 delas ensinam somente em língua alemã; 17, em italiano; cinco, em alemão e português; quatro, em polonês e alemão; quatro, apenas em português; uma em italiano e alemão. O levantamento aponta ainda um dado mais grave: não existem professores e nem material didático adequado para o ensino da língua portuguesa, em qualquer uma delas. Para financiá-las, os colonos contribuem com 52 contos anuais. Caso todas as 112 escolas passem para a órbita do Município, como o quer o prefeito, o custo elevar-se-ia para 80 contos anuais. Diante dos fatos, Alwin Franz Schrader arquiva a ideia. Onde buscar os 80 contos para todas as escolas se, em 1904, a Prefeitura de Blumenau arrecadou apenas 82 contos anuais? Onde encontrar professores brasileiros e material didático em língua portuguesa para os quase quatro mil alunos matriculados naquele ano?
Pois bem. Em agosto de 1906, Afonso Pena, presidente eleito do Brasil para o quatriênio 1906-1910, acompanhado de jornalistas cariocas, entre eles Olavo Bilac, visita Joinville. A cidade experimenta problemas educacionais similares aos vividos por Blumenau. E a leitura dos relatos da viagem causa enorme impressão em Bilac, que escreve crônicas para o jornal "A Notícia", da capital da República.
As constantes referências da imprensa ao "perigo alemão" são injustas e, até descabidas, conclui o poeta-cronista em um de seus textos. Muitos alemães residentes em Joinville possuem fortunas, é verdade, mas eles vivem no Brasil há mais de 30 anos e nunca se lembraram de ir à Europa. São alemães, sim, assevera Bilac. Mas não se consideram súditos do imperador da Alemanha.
Se os seus filhos estudam a língua alemã, e não o português, como deveria ser, a culpa é das autoridades brasileiras, que não procuram manter boas escolas capazes de atrair alunos, pela qualidade do ensino ali administrado. De outra face, os colonos pobres não têm como colocar seus filhos na escola. São os próprios pais que lhes ensinam a língua alemã. Afinal, que outra língua poderiam ensinar-lhes?
Olavo Bilac conclui a crônica alertando que a desnacionalização do sul do Brasil pode acontecer, caso o ensino primário oficial persista como está, sem um mínimo prestígio entre a comunidade alemã de Santa Catarina. Isso no alvorecer do século 20! Mais exatamente: em 1906!

Carregando matéria

Conteúdo exclusivo!

Somente assinantes podem visualizar este conteúdo

clique aqui para verificar os planos disponíveis

Já sou assinante

clique aqui para efetuar o login

Anterior

Saudade sempre saudade

Próximo

Francisco Lobo da Costa um grande vate nunca morre (parte final)

Deixe seu comentário